
Como as noções de “discutível interesse” são diferentes de jornalista para jornalista, interessei-me pela história – afinal, tenho um blog para renovar toda segunda-feira, que requer assuntos pelo menos curiosos – e procurei o Google. Daí, fiquei sabendo que Watson, o gato, havia apertado quatro vezes o botão de rediscagem do número de emergência no telefone, num flat em West Sussex, na Inglaterra, e acionado a polícia. Como deram de cara com um vaso quebrado logo ao chegar, os policiais inferiraram que estava ocorrendo um arrombamento e invadiram o apartamento.
Tudo bem, bela história. Mas, depois de ler sobre a façanha felina, confesso que me restou apenas uma avaliação: grandes coisas!!! Qualquer gato gordo é capaz de apertar um botão de rediscagem quatro, cinco, dez vezes, e provocar o estardalhaço de uma invasão policial. Mas só um inteligente filhote de labrador consegue provocar o terror aos poucos, sutilmente, sem chegar ao cúmulo de chamar a polícia, mas deixando no ar a hipótese de fazê-lo a qualquer momento. Em resumo: só quem não tem um labrador desses em casa é capaz de surpreender-se com as peripécias de um gato inglês.
Para quem ainda não chegou a essa conclusão óbvia, estou falando de Lancelot, aquela pequena catástrofe sobre quatro patas que há pouco mais de três meses passou a habitar minha humilde morada e meus pesadelos. Pois Lancelot descobriu muito cedo que o telefone era um grande aliado em sua incansável busca por atenção, quando uma choradinha baixa na porta do quarto tornava-se inócua.
Numa primeira demonstração de sua descoberta – depois da tradicional choradinha, inútil na ocasião – bastou-lhe puxar o fone do gancho para fazer com que corrêssemos do quarto para a sala, pressentindo uma tragédia. Na segunda vez, como o fragor do fone arrancado fosse insuficiente para o efeito que desejava, ele apertou a tecla do viva-voz, e o ruído tuuu... tuuu.. .tuuu... de linha ocupada encheu a casa no silêncio da madrugada – esqueci de dizer que ele sempre fazia isso quando tinha fome, entre cinco e cinco e meia da manhã. Não satisfeito, na terceira vez ele apertou também o botão de espera de atendimento, e o que ficou ecoando pelo silêncio da madrugada foi a musiquinha chata que atormenta nossos ouvidos enquanto aguardamos uma voz humana.
Mas o mais espantoso veio depois, na quarta vez: sabe o que é ser despertado por uma voz meio metálica, na sala, dizendo tadai ma orusu shite imasu. pii! to narimasu kara onamae to goyo tengo o hanase kudasai? Pois é: mesmo sabendo que o telefone era equipado com secretária eletrônica japonesa, quem é que vai relacionar o cós com as calças num despertar traumático às cinco da manhã? Quem vai conseguir atinar que a voz misteriosa dizia apenas que estava fora e que, após o sinal (sim, o onomatopeico pii!) deveríamos deixar nome e endereço, kudasai (por favor)?
Nosso telefone não tinha aquelas teclas programadas para discagem rápida, mas isso certamente não queria dizer grande coisa: pela marcha da evolução, era questão de dias que nosso pequeno monstro aprendesse a ler e digitasse, um a um, os algarismos 1-9-0. Melhor não arriscar. Por isso, troquei o aparelho de telefone por um que não ficasse ao alcance dele. Sabe como são os policiais brasileiros: seria um pouco mais difícil explicar a eles, antes que uma tragédia estivesse consumada, que tudo não passara de um mal-entendido, de uma brincadeira armada por um cãozinho travesso.
13 comentários:
Quando pensamos que os animais agem apenas por instintos, nos vemos enrascados ao notar inteligência em suas atitudes. A dos cães da raça Labrador então... Está além de qualquer compreensão. Esses cães, os Labradores, faltam apenas se expressar claramente o que desejam de nós. E é tão fácil entendê-los se os amamos sinceramente.
Mais interessante do que a história do gato é essa parte da secretária eletrônica: "ao sinal, piii!, deixe seu recado..." Hilário! Quem não entender que deve deixar o recado depois do piii!, aí é coisa braba!
Que bonitinho! Isso que e necessidade de se comunicar :))
Beijos para o Lancelot!
Não brinca, Cíntia! Se a gente não tirasse o telefone do alcance dele, logo mais o Lancelot estaria ligando para Aurora-Illinois, para suprir a "necessidade de se comunicar".
Contanto que ele nao ligue a cobrar .. hehe
Não duvide...
Depois do Garfield, nada mais que os gatos possam fazer me surpreende!
Outra coisa, Cíntia: já descobri como acabar com a "necessidade de se comunicar" dele; é só mostrar o chinelo e perguntar "quer conversar com ele?" É tiro e queda.
Cuidado com a vinganca.. Uma bela manha voce pode acordar e encontrar o chinelo em pedacos e farelos pela casa.. Vou ficar torcendo :)
Os cães não nutrem sentimentos negativos, como a vingança, o rancor. O amor deles é incondicional. Pode reparar: quando um cão é agredido, é ele quem vai, rabo entre as pernas, pedir desculpas por ter merecido (ou não merecido) a agressão. É mais ou menos como diria Nélson Rodrigues: perdoe-me por eu ter apanhado, mesmo que eu não tenha culpa nenhuma por seu ódio.
Quer dizer que eu não preciso ter medo de encontrar meu chinelo "em pedaços e farelos", como deseja minha prima?
Apesar da vinganca ser um ponto de vista nosso, seu chinelo ainda corre o risco de se desfazer entre os dentinhos afiados dele ! Na cabecinha dele aquela coisa nas suas maos, balancando num modo ameacador, precisa ser eliminada.. Ou.. se voce esta mostrando o chinelo com tanta enfase, deve ser bom pra caramba!
Ah! Esse discutível interesse. hehehehe
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