segunda-feira, 12 de maio de 2008

O morto de Sorocaba


Sabe aquele papo de que a vida imita a arte, ou vice-versa?
Pois é, acho que não existe ambiente para tornar esse corolário mais verdadeiro do que este nosso querido Brasil. Sem querer ser um antipatriota derrotista – daqueles que deveriam ter procurado um aeroporto na época do ame-o ou deixe-o – creio que a vida em nosso país na maior parte das vezes imita a arte: a arte da comédia. Se Deus existe, deve ser assessorado por uma equipe de roteiristas que dá de dez no pessoal do Casseta.
A última do brasileiro é aquela do pedreiro que teve de devolver um cadáver ao IML de Sorocaba (SP) depois de retirá-lo por engano como sendo de seu filho. A comédia de erros, a piada saída certamente da cabeça genial de um desses redatores da equipe divina, foi baseada em duas situações de non-sense:
1 – o filho do pedreiro era louro; o defunto, moreno...
2 – o filho do pedreiro não havia morrido...
Agora, vem cá: como explicar para esses capitalistas cheios de apetite com o investment grade que o Brasil conquistou que isso aconteceu de verdade, que não é apenas mais uma anedota para mostrar como nosso povo, mister, é autêntico, cheio de lero-lero, e que nossas mulatas, my God!, a malemolência, não fica pedra sobre pedra?
-- No, no... no ser possible! Brazil ter povo very funny! It’s a pornochanchada, yeah, cha-cha-cha!

Para quem não acompanhou a história – real, apesar dos sintomas de Macondo, Sucupira e outras locações do realismo fantástico – eis um resumo:
· o pedreiro reconheceu o corpo no IML, vítima de afogamento, como sendo de seu filho de 24 anos, que morava com a mãe em Tatuí, e conseguiu sua liberação para sepultamento;
· no velório, em Votorantim, os convivas perceberam o engano por um detalhe básico: um era moreno e o outro, louro;
· em Tatuí, o filho do pedreiro via TV com a mãe quando descobriu que estava prestes a ser sepultado em Votorantim.

O engano foi corrigido, mas ninguém soube explicar como ocorreu: por que o pedreiro teria reconhecido um defunto fisicamente diferente de seu filho e, mais do que qualquer coisa, por que ele teria achado que o rapaz estava morto?
Sob a luz da razão, dá para entender? Não é mais fácil justificar que nós somos um povo de artistas?

9 comentários:

Unknown disse...

Convenhamos o pessoal do IML também deve ter uma vávula atrasada. Não?
O pai nem se fala, ou estava bêbado ou é louco mesmo!
Betinho Hirtz

Anônimo disse...

ah, sei la.. ele devia estar passando por la, viu um defuntinho meio sozinho, se comoveu e resolveu adotar...

Aqui nos USA a jocozice é ainda pior, o atraso cultural nem se fala.. quanto mais desenvolvido por um lado, mais retrogrado e conservador do outro.

Anônimo disse...

O brasileiro é criativo: resolveu fazer um enterro, não tinha defunto, arrumou um... Quando você quer fazer uma festa e falta motivo, você não arruma? Então...

Prozac

Marco Antonio Zanfra disse...

Pois é, o brasileiro arruma um jeito para tudo: quem sabe o pedreiro não estava querendo arranjar motivo para encher a cara? Quer desculpa melhor para embebedar-se do que a trágica morte de um filho, afogado na flor da idade? E, como o filho foi desnaturado a ponto de não morrer, ele teve de adotar outro para servir de defunto pranteado. Tudo muito lógico, dentro da lógica brasileira.

Bonassoli disse...

Zanfra, não se acanhe sobre os comentários. A fase é ruim, mas passa.

Abraço.

Anônimo disse...

Oi Zanfra, apesar da demora, vou comentar sobre mais um caso inusitado... Eu acredito que todos devem se perguntar o que levou o pedreiro acreditar que era o seu filho? Assim como o caso Isabella e do Austríaco, como acreditar que pessoas "normais" possam fazer estas coisas? Você meu amigo que é atuante na área policial talvez possa nos dar uma resposta... ou não!

Eliz.

Marco Antonio Zanfra disse...

... ou não!

Fabiano Marques disse...

Uma história digna de Nelson Rodrigues. Aliás, naquela equipe e roteiristas do Senhor, ele, o Nelson, deve ser o cabeça.
abrassssssssssss

fábio mello disse...

Isso me lembra um caso parecido que aconteceu na Bahia, não sei se é verídico. "Defunto levanta do caixão e velório termina em forró", estampou um jornal em letras garrafais. A manchete fala por si só. Mais Brasil, impossível.