terça-feira, 29 de novembro de 2011

Nos bares da vida

Li dia desses nos jornais que o Harry’s Bar, “lugar preferido de Ernest Hemingway” em Paris, completou cem anos e fiquei imaginando se, nos vinte anos em que marquei ponto nos vários bares da vida, teria conseguido emprestar a algum deles qualquer espécie de referência turístico-cultural. “Está vendo aquele boteco pé-sujo ali? Pois é, Marco Zanfra tomava de dez a doze cervejas naquele balcão, todos os dias...”, diria um orgulhoso íncola a um embevecido turista. Por que não?
Certamente esse bar não seria em Paris e certamente não sou Hemingway, mas será que nenhuma lembrança deixarei, depois de vinte anos de frequência diária? Ainda que seja um autor com apenas um livro publicado, não haveria nada que diferenciasse minha presença das centenas de milhares de bêbados que babaram nesses balcões durante esses anos todos?
Pensando bem, acho que não. E começo meu pensamento negativo por um exemplo que morreu como ponto de referência: o bar que mais frequentei na vida, na alameda Barão de Limeira, foi transformado em estacionamento. E seus balcões, o tilintar de copos e o cheiro de gordura das porções de calabresa ficaram apenas na memória – ainda que às vezes numa memória obliterada pelos excessos alcoólicos. O bar que poderia ser apontado como o “Harry’s do Zanfra” não existe mais.
Frequentei esse bar, o Miranda – ou Bar do Mané, Bar do Luiz, Bar do Juvenal ou ainda, oficialmente, Bar e Lanches Para Você – durante os nove anos em que trabalhei na Folha de S. Paulo. Batia o ponto na entrada e na saída, não raras vezes no meio do expediente, e também não raras vezes nos fins de semanas, ou mesmo depois de ter saído do jornal. Era uma referência para mim – e eu lamento não poder ter sido uma referência para eles, como Hemingway o foi para o Harry’s – além de um ponto de encontro. Se havia, pois, um botequim que podia ser associado a mim, era sem dúvida aquele.
Hoje, no entanto, dois ingredientes básicos dessa mistura – o Miranda e meu convívio com a bebida – deixaram de existir. Por isso, não vai ser nada fácil - se isso ainda não feito - associar atualmente minha imagem a bares.

Quem quiser apontar o “lugar preferido de Marco Zanfra”, hoje, vai ter de se contentar em mostrar minha própria cama.

Em tempo: Como não trabalhei apenas na Folha, guardo lembranças boas de outros botecos que frequentei na vida profissional, e seria injusto deixar de referir-me a eles. No tempo do Jornal dos Concursos, frequentava a Toca do Coelho; no Diário Popular, o ponto era no Mutamba; no Cidades, de Ribeirão Pires, o bar do Toninho era nosso esconderijo (embora desse para enxergar o bar da janela da redação); e, na revista Agora!, o bar do Celestino. Em todos eles, vale lembrar, com crédito ilimitado.
O bar do Celestino, aliás, merece um verbete à parte: as reuniões de pauta da revista eram feitas às terças-feiras, às duas da tarde; depois da reunião, o reportariado todo debandava para o bar, e ninguém trabalhava. Tentando conter esse êxodo improdutivo, o diretor de redação, Mário Chimanovitch, mudou a reunião para às segundas-feiras, às 9 da manhã. Mas só conseguiu mesmo, como era de se esperar, antecipar nossa ida ao bar do Celestino...

6 comentários:

Bob Aguiar disse...

Todo o Centro Velho de São Paulo hoje é um verdadeiro mictório a céu aberto Zanfra.
Tudo de bom que havia alí já está à muito tempo nas brumas do passado.
O meu Trianon, hoje virou loja de sapatos, fazer o que.
E não pdemos dizer que é o progresso pois tudo foi mudado para um nível bem rasteiro.]

Serafim disse...

CARO ZANFRA

Fico recordando dos tempos da Cásper em que vc bebia suco de laranja na lanchonete ao lado do Cine Gazetinha.Lembra? O Mundo sempre dando voltas.Tempos bons aqueles.

Abraços

Marco Antonio Zanfra disse...

Suco de laranja?! Eu?!

Anônimo disse...

Prezado Zanfra

Espero que essa sua nostalgia não demore muito a passar.....pois mesmo que quiséssemos relembrar fisicamente aqueles tempos, não há mais nada a não ser os mictórios a céu aberto.Eu sempre senti um fascínio por essa vida de bares,de encontro de amigos e uma "pauta" improvisada,embora eu nunca tenha tido qualquer experiência nesse sentido: mau pai era das antigas rsrsrs. Mas por motivos mais consumistas, eu gostava mesmo do Arouche que foi totalmente desfigurado. Trabalhava na Dr.Vila Nova e no horário de almoço eu e minhas amigas corríamos até lá. Uma coisa é verdade....somos felizes de termos estas lembranças. Eu lembro até de como eram as Sete Quedas do Iguaçu,estive lá.Bem...espero ter-lhe aliviado um pouco. Falei demais...também fiquei dois meses sem computador....
bjusssssssssssssssssss
sonia carotta

Marco Antonio Zanfra disse...

Dois meses sem computador, e nós dois meses longe de suas sábias palavras...

Anônimo disse...

Prezado Zanfra
Você é um fofo... gradicida
bjusssssssssssss
sonia carotta