segunda-feira, 3 de setembro de 2007

Prevenir e remediar


Alguém aí ainda se lembra da resolução 42 do Conselho Nacional de Trânsito (Contran), aquela que listava que tipos de bandagem, esparadrapo e gase deveriam conter os estojos de primeiros socorros obrigatórios nos veículos? Pois é, embora não tenha sido ela a criadora dos kits – o monstrengo já estava delineado no artigo 112 do Código de Trânsito Brasileiro – foi a resolução 42 que definiu a data (1º de janeiro de 1999) em que a obrigatoriedade entraria em vigor.
E o que se viu, então, entre 1º de janeiro e 15 de abril – quando foi publicada a lei 9.972, que revogava o artigo 112 do Código – foi um comércio alucinante. Era posto de combustível, camelô e farmácia, era supermercado, loja de 1,99 e banca de jornais, era gente que nada tinha a ver com o assunto tentando faturar algum com a obrigatoriedade regulamentada pelo Contran.
Estavam errados, eles?
Façamos as contas: em 1999, a frota no País era de 32.318.646 veículos; descontando-se 20% dos que não têm muita afinidade com o cumprimento de normas, teremos um mercado consumidor de 25.854.917. Fazendo um precinho legal – R$ 10, para facilitar as contas – a previsão era de que mais de R$ 258 milhões seriam rapidamente injetados na economia formal e informal, garantindo alegria para muita gente durante um bom tempo. Estavam errados, eles?
Eles, não. Quem estava errado era quem pretendia empurrar-nos a obrigatoriedade de um estojo de primeiros socorros, quando as mais elementares noções de segurança proíbem que se mexa numa vítima de acidente de trânsito. Por que, então, tornar obrigatório um kit que não poderia ser usado, a não ser para socorrer um dedo ferido numa troca de pneu – algo que um simples band-aid resolveria?
Até hoje não ficou inteiramente explicado o animus do legislador ao empurrar-nos goela abaixo o kit obrigatório. Nos três e meio de sobrevida da norma teratóide, é inegável que muita gente ganhou dinheiro (legalmente), mas também é indiscutível que muitos investiram o que tinham na compra de estoques, foram surpreendidos com a degola do monstro e estão servindo estojos de primeiros socorros até hoje nas refeições da família.

Se alguém faturou por baixo dos panos, não ficou provado. Ficou provado, isto sim, que o povo está mais arisco para esse tipo de coisa, e já está com um pé atrás com essa nova exigência do Contran (resolução 245), que torna obrigatória a instalação de um sistema antifurto – que prevê bloqueio e rastreamento – nos veículos que saírem das montadoras a partir de 1° de agosto de 2009.
Ora, ora, ora... se o equipamento é obrigatório, a inexistência dele nos veículo pode render ao proprietário uma multa por infração grave. Mas a resolução dá ao proprietário o poder de decidir se põe em funcionamento, ou não, o sistema de rastreamento (GPS) – que deve custar-lhe, mensalmente, algo em torno de R$ 100 pela prestação de serviço da empresa rastreadora.
Ora, ora, ora... ter o equipamento no veículo e não acionar o rastreamento é ter no veículo um equipamento inútil. É como deixar mudo na traseira da picape um módulo A800 Power System, com quatro alto-falantes e duas cornetas... ou como ter no porta-luvas um estojo de primeiros socorros e não usá-lo para socorrer vítimas de acidentes de trânsito.
Este é o lado negativo da questão. Temos o lado mais negativo ainda: a segurança pessoal. Por que o assaltante que rouba um carro deixaria que seu proprietário ficasse livre para poder acionar imediatamente o rastreador? E se o proprietário não estivesse pagando pelo serviço, o ladrão acreditaria nisso? O quê? Um equipamentão desse e tu vai dizê que ele é inútil? Pensa que eu sou otário, mermão?

A história dos estojos de primeiros socorros sobreviveu três meses e meio, antes que sucumbisse à própria inconveniência. A do equipamento antifurto tem chance de que até agosto de 2009 pinte uma luz no fim do túnel.

Um comentário:

José Luiz Teixeira disse...

Meu caro Zanfra. Obviamente, alguém ganhou muito dinheiro em cima dos trouxas, ou seja, nós, com esse estojinho dos primeiros socorros. Mas pelo menos para mim serviu, quando meu filho era pequeno e cortou o pé numa festa de reveillon no sítio.