terça-feira, 4 de março de 2008

Ora, veja!


Quando alguém da direita chama seus desafetos históricos de esquerda “obtusa e obscura”, epa!, uma sineta soa lá no fundo de nossa memória, como se algo na decoração destoasse do conjunto ou como se cachinhos dourados tivesse tocado no mingau de um dos ursos. Não era o contrário? Não era a esquerda que gritava as palavras de ordem contra a direita “fascista” e “reacionária”, ou com adjetivos mais nojentinhos como “xexelenta” e “lambisgóia”?
O que mudou? A direita sempre foi comedida, talvez envergonhada, em sua postura. Nem durante o regime militar eram ouvidos comentários tão ácidos e demolidores. A direita perdeu a vergonha ou descobriu uma garganta que sustentasse sua voz?
Fico com a segunda hipótese. O trecho a que me referi no início do texto foi colhido de uma das 13 mensagens de leitores da “Veja” desta semana, aplaudindo o enfoque dado pela edição anterior ao anúncio de que Fidel Castro estava deixando o poder em Cuba. Vale frisar que a revista publicou 13 cartas de leitores, todas favoráveis a ela, o que permite duas interpretações: ou a esquerda não a lê e não a critica – hipótese que soa menos absurda do que pareceria a princípio – ou a direção do periódico considera quem destoe de seus paradigmas exatamente como um leitor se referiu a Fidel: “um nada”.
Não estou aqui para defender o longo mandato de “el comandante”, mas quero crer que ele mereceria um tantinho mais de respeito por sua importância histórica. Nem as nuvens de gafanhotos ou quaisquer das outras das pragas do Egito receberam tratamento mais humilhante do que o “já vai tarde” que a “Veja” estampou na capa de sua edição passada. “Isto é jornalismo? Não, nitidamente, não é jornalismo. Se alguém tinha alguma dúvida, a capa de Veja desta semana é esclarecedora: trata-se de um panfleto de direita e não uma revista informativa”, vociferou o jornalista Luiz Antônio Magalhães, no “Observatório da Imprensa”.
Mesmo um “ditador sangüinário” mereceria sua contextualização no momento histórico que, mais do que apenas fazer parte, comandou. Qualquer um traçaria esse paralelo, menos a direita maniqueísta e uma publicação que, outrora – e bote outrora nisso! – um referencial do jornalismo, prefere tratar o assunto hoje panfletariamente.
Não me espantaria se, em vez do “já vai tarde”, a revista tivesse estampado um “ufa, até que enfim o pentelho largou o osso”, porque há muito “Veja” vem-se comportando de maneira arrogante, com nenhuma esperança de reversão de expectativas. Pelo andar da carruagem, dá para pensar em duas possibilidades: ou sua arrogância fugiu ao controle da Editora Abril - que não consegue recolocá-la nos eixos, apesar do prejuízo que essa postura está acarretando a seu faturamento publicitário - ou vem aí um grande golpe e a revista está exercitando a garganta para cantar no terreiro como porta-voz oficial da nova ordem.

Mudando de assunto, vocês queriam o quê? Sendo pai de um piteuzinho como a Rosane Mulholand, vocês acham que o reitor da Universidade de Brasília ia decorar o apartamento dele com produtos comprados numa loja de 1,99? Façam-me o favor! O homem é de griffe!

9 comentários:

Anônimo disse...

Buenas...
Depois de ler este belo texto, fico até meio sem jeito pra comentar algo...
Mas, tenho que dizer pelo menos uma palavrinha...
Bom, a imprensa ás vezes faz um belo trabalho, mas tambem, como em todo lugar, tem aqueles que so gostam de "colocar fogo" nas noticias e acontecimentos...
Mas além de tudo isso, tem aquela imprensa poderosa e esmagadora, que vai passando por cima de tudo e todos, sem se importar com as consequências...
Bom, acho que é isso...
Parabéns pelo texto Zanfra..

Abraço
André Campos

Anônimo disse...

Pelo jeito, o discurso da direita não convence mais aqueles que dizem ser "nem de esquerda, nem de direita", que para mim é o mesmo que afirmar ser de direita. A realidade manipulada, para o interesse de alguns está sendo questionada. Isto é sinal de democracia, mesmo não sendo a ideal. Mas chegamos lá...
Viva la revolución!...
as. sujeito oculto (já não tão oculto)

Anônimo disse...

1. Tanto o que falar.. Primeiro, o significado de "esquerda" perdeu todo seu contexto num mundo pos-grande-era-do-comunismo, hoje globalizado pelas razoes erradas, e com novos "demonios" a combater.

A Veja errou sim no tom, pelas razoes que o primo falou.

Anônimo disse...

2. Ja fui "de esquerda" mesmo antes de saber o que queria dizer e hoje nao acredito mais na Libertacao (?) pela Revolucao. A libertacao que prendeu, que em nome do modelo instaurado, torturou, matou, assim como a direita fez.. e faz..
Agora, tiro meu chapeu pelo Fidel, que conseguiu esses anos todos "nao precisar" dos EUA..

Anônimo disse...

3. AInda que Cuba viva em ruinas, educacao e saude e realmente pra todos. Mesmo depois da caida do comunismo na maioria do globo, Fidel ainda conseguiu fazer com que Cuba se sustentasse, provendo o basico a populacao, mas um basico de primeira qualidade.
Agora o que eu queria mesmo saber e se...

Anônimo disse...

4. O que o Fidel tem a ver com a captura do Che? Esse sim fazia o que fazia por ideal, e quando comecou a criticar o rumo que Fidel estava dando aos ideais, passou a incomodar... A populacao ja nao estava mais de lua de mel com Fidel.. nada melhor que calar o Che e ainda por cima ganhar um martir..

Anônimo disse...

A gente tá cansado de ver que a Veja emagrece a olhos vistos - e não é por causa de uma dieta. O empresariado progressista está evitando "certas companhia" e por isso o faturamento com anúncios está caindo desesperadamente. Eles compensar aumentando as assinaturas e por isso estão "dando" mais de um mês de "degustação". Mas não dá certo: todo conhece e ninguém mais quer. A revista está um nojo. Só quero ver até quando a Abril vai suportar carregar a Veja no vermelho.

CACHINHOS DOURADOS

Anônimo disse...

Olha, foi um dos melhores textos que já fizestes. Já estava ficando preocupada achando que teu senso crítico havia se perdido. Aprecio pessoas que se debruçam sobre os acontecimentos com a preocupação de apurar a verdade entre os fatos e a especulação. Posso estar a especular, mas não estou de toda errada: a revista supracitada manipula os fatos para beneficiar não sei quem. (ou será que sei...?). Ficar à mercê deste meio de comunicação para estar antenado, por favor, esquece. Eu sugeriria, se me permite o espaço, outras leituras. Tais como: Caros Amigos e Carta Capital. É um jornalismo mais preocupado com a apuração da verdade. Fica aí a sugestão. Então é isso Marco Antonio Zanfra. Parabéns pelo retorno as coisas mesmas.

Anônimo disse...

Caro Zanfra,

Concordo com todos os comentários postados até aqui, tanto em relação à gradativa queda de qualidade dos informes trazidos pela revista em foco, quanto no que se refere à excelência do teu texto. Ah, e aproveito a oportunidade para te congratular, também, pela beleza de folder (super artístico!) que produziste para a nova campanha do DETRAN, que veicula um trocadilho genial! SHOW!!!
Maria Augusta Probst