segunda-feira, 24 de março de 2008

Os bicos da PM


O relatório é da própria Corregedoria da PM paulista: quase 70% dos policiais militares mortos em São Paulo entre 2005 e 2007 estavam “fora de serviço” – maneira eufemística de dizer que morreram exercendo atividade paralela, ou, no jargão popular, “fazendo bico”. Realizar trabalhos correlatos na área afeita à segurança pública – segurança armada, por exemplo – é proibido pelo regimento da corporação. Mas quem há de coibir?
Ninguém faz “bico” porque gosta de ficar 24 horas por dia com o dedo no gatilho, com os nervos à flor da pele ou a ponto de dar um tiro na própria têmpora. O único interesse é complementar o salário insuficiente. E o risco maior é o policial escapar da morte pela inanição para encontrá-la no suicídio por colapso nervoso. São duas frentes difíceis de encarar.
Dos males o menor: policial que completa os minguados ganhos fazendo “bico” está evitando conseguir os rendimentos extras à custa de ilegalidades. Mesmo que seja ilegal o trabalho paralelo, é certamente menos ilegal do que extorquir, meter-se com o tráfico, vender proteção.
Dos males o pior: por que os governos remuneram da pior forma os dois extremos da curva da violência, os professores e os policiais? O soldado PM paulista recebe R$ 1.240 por mês (é o 13º no ranking de salários policiais militares do País, o que significa que há outros 14 ainda piores), mas ganha quase R$ 100 a mais do que um professor. Alguém consegue explicar a disparidade? Não seria muito mais barato investir em educação – ao lado, claro, de outros incentivos sociais – já que o crescimento escolar é diretamente proporcional à diminuição da necessidade de segurança?
Mas, voltando aos “bicos”: difícil, num país em que a grande maioria de assalariados recebe baixos vencimentos, visualizar a precária remuneração dos policiais. Eu mesmo, como repórter, só consegui sentir a dimensão da miséria quando, na “Folha da Tarde”, em 1988, fiz matéria justamente sobre os baixos salários da PM e descobri a história de um policial cujo velório havia sido feito num campinho de futebol, pois a sala de sua casa era insuficiente para conter o caixão.
Hoje, 20 anos depois, mudou alguma coisa? As família dos PMs têm, hoje, casas maiores para fazer seus velórios menos indignos? Se têm, com certeza foram compradas à custa de muitos “bicos”, porque os governos continuam achando que quem cuida da segurança o faz por vocação e idealismo. Portanto, o salário é apenas um componente de menor importância.

5 comentários:

Anônimo disse...

TRabalhei ha tempos Ogilvy & Matter, uma agencia de publicidades que ficava pertinho da Reboucas, atras do Eldorado. Era numa casa bonita, mas suscetivel a massa criminosa que rondava a area. Pois bem: na casa tinhamos 3 PM's, jovens, bonitoes, musculosos, que faziam Bico como seguranca. Sera que preciso dizer que a mulherada adorava a presenca de tanta testosterona? Mas nao foram poucas as vezes que eles levaram algum suspeito nos fundos da casa pra encher de sopapos ...

Anônimo disse...

Acho que discutir os níveis de testosterona não é bem o objetivo desta postagem...

Lázaro Kühns

Fabiano Marques disse...

Acho que não é só na polícia que se acredita que "quem cuida da segurança o faz por vocação e idealismo". Em outras profissões, patrões, ou o próprio poder público, também acreditam nisso.

Marco Antonio Zanfra disse...

Você não estaria querendo dizer "no jornalismo", pois não?

Fabiano Marques disse...

a idéia genial do Fala Zanfra já tá lá.
Falta aqui, agora. heheheh

abraço