segunda-feira, 21 de junho de 2010

Arreda, capeta!

Para aqueles que, como eu, são fãs dos filmes de terror e estão acostumados às manifestações físicas, sensoriais e ectoplásmicas dos que não se conformam em partir desta para a melhor, não há susto que não seja administrável. Manifestações pós-morte absorvidas em episódios de Ghost Whisperer, Tru Calling e Medium ajudaram a formar uma geração impermeável ao medo de mortos-vivos de qualquer espécie. Não há cadáver contando até dez na geladeira que provoque arrepios nos filhos dessa classe de discípulos do fantasmagórico. Tudo é muito natural, previsível e, de certa forma, engraçado.
Mas isso só funciona assim com essa legião de escolados, para quem o Além é logo ali e os fantasmas e outras formas de espectros são tão recorrentes quanto um bocejo. Com os que tratam a morte simplesmente como uma cessação de movimentos e os mortos como meras carcaças compostas de ossos, músculos, pele e vísceras, a compreensão de alguns fenômenos pode se dar de maneira diversa. Com os trabalhadores cujo ambiente de trabalho é a morte – como legistas, coveiros, embalsamadores, para quem o cadáver é apenas matéria-prima à espera de manufatura – a absorção de acontecimentos extradionários pode ser a mais pragmática ou a mais estapafúrdia possível..
Se você está a passeio por entre as frias mesas de aço de um necrotério, por exemplo, e de repente um dos hóspedes resolve se mexer... o que pensar? Não vou garantir que nós, os fãs de filmes de terror, não tenhamos um pequeno tremor de susto com a ligeira alteração da cena previsível, mas é coisa passageira. O prazer cinéfilo de acompanhar os próximos passos do enredo vai suplantar qualquer tentativa de nos meter medo que o diretor do filme tenha concebido. A vontade de seguir o desenrolar das cenas vai ser naturalmente maior do que a vontade de sair correndo.
Os pragmáticos também não vão sair correndo, mas é por outro motivo: vão achar que aquele corpo até então inerte foi acometido por espasmos pós-morte, por alguma descarga de eletricidade estática mal resolvida, e que logo em seguida a normalidade voltará a reinar sobre a passividade da morgue. Mas os estapafúrdios... ah, esses vão engolir qualquer explicação, de espasmos a inaceitação da morte, mas só depois de três dias, quando pararem de correr. Tudo pode ser explicado, segundo eles, depois que a adrenalina for diluída pela corrente sanguínea. Até lá, sai da frente!
Não sei que tipo de pessoa – cinéfila, pragmática ou estapafúrdia – estava de serviço no necrotério de Maceió quando uma das mortas começou a se mexer, na semana passada. A notícia no jornal descreve apenas que a mulher, com óbito declarado duas horas antes, estava bem viva quando começou a movimentar-se, ao contrário do que se esperava dela. Não foi espasmo, não foi rebeldia contra o destino... foi vida mesmo.
No hospital que a havia dado como morta – depois de tentativas de ressuscitação, segundo o diretor – foram aventadas três hipóteses: ou os medicamentos que ela recebeu na busca pela reanimação tiveram efeito tardio, ou a mulher entrou em estado de catalepsia, ou houve erro na declaração do óbito. Em qualquer dos três casos, faltou dizer, ela estava VIVA, e portanto não podia ter sido levada a um necrotério, de onde só se sai para o buraco.
A mulher morreu menos de 24 depois. Mas poderia ter sido enterrada viva. E certamente voltaria da tumba para vingar-se.

19 comentários:

Anônimo disse...

Prezado Zanfra
Creio que a maioria das pessoas vivas têm mais medo dessas situações...serem declaradas mortas e estarem vivas,por qualquer circunstância não prevista pela medicina. Há quem se prepara com celulares....muitos celulares para levarem junto.Eu,sinceramente, prefiro ser declarada e estar realmente morta,para não ter que passar duas vezes pela situação.....affffff é macabro.
soniacarotta

Cintia disse...

NAo sei exatamente o que fazem com os corpos ai nos necroterios brasileiros, mas aqui nos UEA, todos os orgaos e visceras sao removidos e os corpos embalsamados. Portanto, nao ha chance de ser enterrado vivo (se ainda estiver alguma vida no azarado, ela vai ser arrancada com o recheio da cavidade toraxica /abdominal). Pra mim, melhor assim..

Anônimo disse...

Tb prefiro que me arranquem todas as vísceras para não acordar dentro de um caixão como, dizem, ocorreu com um ator de novelas famoso dos anos 60, cujo nome não me lembro agora.

abs
jluiz

Marco Antonio Zanfra disse...

O nome dele era Sérgio Cardoso, José Luiz. Diz a lenda que, ao abrirem o caixão, cuja tampa estava toda arranhada, encontraram-no de bruços.

Bob Aguiar disse...

Enterrado vivo! isso sim deve ser extremamente horrivel. se já não bastasse a morte! Por isso, deveriam baixar uma Lei, para que todos os mortos só baixassem para a cova após 24 horas da declaração do óbto. Não sou médico e comento só por leitura sobre o assunto. Dizem que estado de catalepsia dura 24 horas (os especialistas que me corrijam), daí, não custa esperar um pouquinho mais. Se bem que para alguns, se for a "Amada sogra" o enterro deve ser imediato!

Marco Antonio Zanfra disse...

... e dizem que a sogra deve ser enterrada de bruços - para, ao acordar e tentar sair da cova, cavar para baixo!
(credo! quanta maldade!)

cilmar machado disse...

Zanfra:
Dado o assunto, o título de sua crônica deveria ser outro. Ao invés de enxotar o capeta, que tal Valha-me Deus!
Que assunto bravo, sô!...

Bob Aguiar disse...

Boa Zanfra, embora eu "ame" minha, que já partiu para o além terra!!

Ricardo Câmara disse...

Prezado Zanfra;
Entre almas, espíritos e fantásmas, estes dependem da idiossincrasia de cada pessoa.Quanto aos costumeiros espasmos ocorrido nos necrotérios,é preciso que se tenha uma equipe médica de plantão nessas instituições sem que todas as atitudes fiquem à mercê da necropsia, onde apenas um périto na arte de dissecar um corpo procura encontrar a causa mortis.Se outros profissionais de diversas especialidades da saúde tivessem presente no momento em que a mulher (IML Maceió)tentou ressuscitar, talvez tivessem evitado a sua partida abruptamente para o outro lado.Enquanto se respira,, presumi-se que há tentativa de sobrevivência.Quantos corpos em estado cataléptico entraram em convulsão, posteriormente,dado a um laudo de um médico legista...

Marco Antonio Zanfra disse...

Só um reparo, Ricardo: ela não "tentou ressuscitar"; ela estava viva!

Ricardo Câmara disse...

Certo, mas pelas tenativas de ressuscitações realizado no Hospital e sem sucesso, pelo que entendi,a mulher havia entrado em EQM-Experiência Quase Morte, que infelizmente, após voltar à vida na mesa obituária do necrotério, não houve o devido socorro para mantê-la ativa,retornando assim,para o local que ela ainda não estava preparada para ir.Bom, pode ser que seja assim,afinal, para morte, sempre há uma desculpa...

Marco Antonio Zanfra disse...

Pelo que eu li, os médicos ficaram espantados por ela ter resistido tanto, já no necrotério, longe dos respiradores que a mantinham viva no hospital. Numa análise bem rasteira, isso pode significar que, se continuasse ligada aos aparelhos, provavelmente ela não teria morrido a segunda vez.

Anônimo disse...

Opa!!!
Já que estamos falando em morte por aqui, aqui está de volta um "morto - vivo" pelo menos aqui no blog.
Bom, sobre o post, tenho certeza que 3 dias não seriam suficiente para que eu fosse correr, mas o dobro deste numero com certeza...Não gosto nem de falar neste assunto, infelizmente tive que ir ao cemitério 2 vezes, no enterro do meu vô e no enterro da vó de minha noiva. Agora, essa mulher aí, por acaso o nome dela era Esperança?
Tás´é loco!!!
Abraço....

André

Marco Antonio Zanfra disse...

Mais morto do que vivo, né, André? Faz mais de ano que não temos sua delicada presença neste espaço!

Fabiano Marques disse...

Bah!!! Enterrado vivo??? Nem morto!!! kkkkkkkk
Zanfra, não deixe o samba, nem o blog morrer.
Abraço

Vico disse...

Já que vida está pela hora da morte, muito adequada sua abordagem...

Blog do Morani disse...

Oi Zanfra, meu amigo:

Estou em fase de recuperação, mas com muitas restrições. Como me sinto melhor - passada a fase crítica -, dei um pulinho até cá neste espaço pra lá de democrático e informativo, e outras vezes jocoso pelos comentários maravilhosos que postam em seu blog. Você, meu caro, é um gentil-homem quais os existentes em boas épocas. Obrigado pela sua deferência publicando meu aviso de afastamento como se um comentário fosse. Gostei do seu desempenho no Programa da TV "Casos de Família" da Cristina Rocha, SBT. O que faltou ao amigo foram maiores chances que não lhe chegaram pelas presenças de Zulaie Cobra, Esper e mais outros dois convidados. Zulaie, como todos sabem, não deixa ninguém falar; quer aparecer. A mim, o mais gratificante foi conhecê-lo "ao vivo" pois apenas o via no cabeçalho de seu blogger Fala Zanfra! Você falou pouco, mas deixou o seu recado. Programas de entrevistas de TVs são sufocos, correrias, segundos contados; discute-se muito, falam todos ao mesmo tempo (você esteve quieto)e não informam nada, e os que têm alguma coisa a dizer não os deixam: cortam na "lombada" ou abafam suas vozes. Parabens por sua polidez. Abraços.

Marco Antonio Zanfra disse...

Vou ser sincero, Morani: não tentei ganhar espaço no grito porque Sílvio Santos pagou minhas passagens e mandou me buscar a levar ao aeroporto. Se eu tivesse que, de alguma forma, gastar algum para estar ali, ah, creia-me, armaria um barraco para contribuir com a finalidade do programa. Mas fui enganado: pensei que fosse acontecer um debate jornalístico, mas o que se viu foi só oba-oba.
E bem-vindo, mais uma vez: você sempre comprova que seu poder de recuperação é maior do que as agruras que tentam derrubá-lo.

Fabiano Marques disse...

Bitio, veja o que seu comentário sobre o Zero a Zero no meu blog fez.
Rendeu um post ao contrário, feito nos comentário. rsrsrs
Não concordou, mas rimou .
Concorda?
hehehehe