segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Quem não tem cão...

Ou melhor: quem não tem zebra... pinta um burro.
Não é simples? Pois foi o que fizeram os funcionários do parque Marah Land, na cidade de Gaza, que pintaram listras pretas e brancas em dois jumentinhos que estavam por ali, pastando tranquilamente e pensando na vida, e os elevaram instantaneamente à condição de zebras, espécimes em falta naquele minizoológico.
Não, não foi – embora possa parecer – um “golpe” aplicado nas incautas crianças palestinas, mas o único recurso encontrado para substituir as duas zebras legítimas e originais, que morreram de fome em janeiro, castigadas, aliás como o restante da população, pelo eterno conflito com os israelenses.
A intenção da camuflagem é tentar melhorar a frequência ao parque, porque, afinal, quem é que vai visitar um zoológico se não pode conhecer ali dentro uma simples zebra?
Não ficou claro, entretanto, se os funcionários do parque conseguiram enfim responder a um dos mais antigos dilemas da humanidade: eles pintaram os burros de branco e acrescentaram listras pretas, ou pintaram os burros de preto e acrescentaram listras brancas?

Semana passada teve o quê?
Bom, teve aquela injustificada destruição dos laranjais pelo pessoal do MST, teve a prisão daquele ex-deputado do Amazonas, que mandava matar para ter o que comentar em seu programa de TV, teve a condenação do “motosserra” Hildebrando Paschoal, teve a filiação do “socialista desde criancinha” presidente da Fiesp ao PSB...
Mas teve o principal e mais marcante: a escolha do Rio de Janeiro para sediar os jogos olímpicos de 2016. Principal, porque ninguém há de negar a importância de sediar os jogos olímpicos e de ser o primeiro país da América do Sul a fazê-lo, mesmo que isso represente apenas a mesquinha e discutível supremacia sobre os argentinos – e mesmo que isso tenha servido para provocar um ligeiro arranhão ao prestígio do todo-poderoso Barack Obama, que viu sua Chicago ser defenestrada da disputa já na primeira rodada.
Mais marcante, porém, por um motivo diverso: porque me permitiu uma breve viagem ao futuro e me possibilitou antever que 2016, salvo algum acidente de percurso, será o ano em que completo seis décadas de vida.
Sabe lá o que é fazer sessenta anos? A primeira idéia que me vem à cabeça é que, a partir daí, as pessoas param de se referir a você com a expressão “coitadinho, morreu tão moço!” Quando se tem cinquenta, cinquenta e poucos, a impressão que dá é que você ainda está em processo de envelhecimento. Ao chegar aos sessenta, parece que o processo está completo.
A partir de 2016, posso receber atendimento preferencial, posso sentar em bancos reservados, posso estacionar em vagas exclusivas, posso ter gratuidade nos transportes públicos... e posso ser humilhado, como a maioria dos idosos o é em terras brasileiras.
Tenho pelo menos um leitor – Morani – que já ultrapassou a barreira que eu vou alcançar quando o Rio de Janeiro sediar os jogos olímpicos, e eu espero que ele tenha palavras de alento para tranquilizar este futuro neo-sexagenário, para quem a vida depois dos sessenta é uma grande incógnita.
Para não dizer que o futuro é um poço de dúvidas, tenho pelo menos uma certeza a respeito dessa nova fase da minha vida: ninguém vai me ver frequentando grupos, atividades, bailes e outras opções de lazer dirigidas à “melhor (para quem?) idade”.

32 comentários:

Carlos Martí disse...

Eu também fiz essa viagem virtual e, justo nesse mesmo momento eu me vi assitindo as Olimpiadas no Rio, meio turista, meio brasileiro, já que meu irmão mora lá e tenho até uma sobrinha carioca. Imagino-me passeando por ruas e praias seguras, mesmo que ainda sob uma filosofia policialesca e repressiva (e, por isso paternalista) tão típica do Brasil. Isso, suponho, vai perdurar por mais tempo, já que reflete um caráter cultural, associado a uma ausência de compromisso e implicação de uma população acostumada a ser tutelada, a que decidam por ela(daí a típica frase: é culpa do governo...). Repito, essa transformação será muito mais lenta do que as mudanças práticas e mais objetivas que já começamos a observar, principalmente, aqueles que o fazemos à distância.
Marco (nome do blogueiro e não limite ou enquadramento de um objeto ou tempo), na minha imaginação, não me vi como um ancião e isso não é só uma questão de otimismo, mas ao fato de que hoje em dia, ter sessenta anos, na grande maioria dos casos, significa ter ultrapassado recentemente o equador da vida, principalmente, quando se mora na Europa. Não só por que aqui as pessoas mais velhas sejam brindadas com um respeito merecido e conquistado, mas por que, ao chegar, à maturidade, passam a desfrutar de privilégios que lhes permite aproveitar a tranquilidade de uma fase da vida mais descomprometida e aliviar assim cada uma das novas dores que vão aparecendo quase diariamente, que ninguém é de ferro.

Cintia disse...

Quem e que garante que voce nao vai se juntar a algum grupo de hidroginastica para aliviar ar artrites ou dores reumaticas, ou aprender danca de salao? Nunca se sabe para onde seu cerebro vai descambar.. Eu, com sorte, se seguisse a onda americana, mudaria para a Florida. Mas la ja tem muita gente idosa, nao quero! Vamos para a Espanha! (Nos aguarde, Carlos!) Nao que la nao tenha gente velha, mas nao da pra comparar com a Florida, cenvenhamos..

Cintia disse...

E so para esclarecer.. De velhos ja bastaremos o Kim e eu, por isso quero ficar perto dos jovens!

Baile-do-mela-cueca disse...

A única certeza que você poderá ter ao chegar ao 60 é que voê será um idoso sexy.Um SEXYgenário.

Unknown disse...

Mudando de assunto, se me o permitem, queria fazer uma consulta a quem mora no Brasil. Leio com frequência o absurdo em que se transformou a Folha de São Paulo e sou obrigado (por que quero, claro) a engolir "opiniões" e "pontos de vista" como os de Kenedy Alencar, Josias de Souza, Fabio Seixas etc. A pergunta é: Clóvis Rossi é realmente um oásis nesse deserto ou é uma miragem da minha parte. Lembro dele de há muito muito tempo como alguém de idéias claras e progressistas, mas desde então, suponho, mudou o Brasil e mudei eu e, sobretudo, ele.

Blog do Morani disse...

Olá, meu caro amigo Zanfra. Grato por lembrar-se de um septuagenário que apesar de ter ultrapassado a marca perfeita dos 70 anos - 74 é a minha condição atual - não tem muitos conselhos a dar..
Ao chegar aos 60 em 2016 gozando boa saúde, sentir-se-á tão lépido e faceiro como aos 50 ou aos 60 anos. Aos 62 anos, eu fazia coisas estupendas: pintava, jogava futebol, comia e bebia bem, nadava, amava e dormia melhor. Presentemente, me acho limitado pelas mazelas (dou graças a Deus por elas terem aparecido após os 63 anos) por minha exclusiva culpa. Achava-me supimpa aos 50 (lógico!) e tome churrascos gordurosos, uísque, Ypioca prata, cerveja (2 litros/dia) até chegar àquela marca dos 63! 13 anos sobrecarregando meus órgãos nobres, por acreditar piamente fosse a cerveja bebida diurética. Não era e não é. É veneno para os rins. Só posso lhe dizer, meu caro amigo, se você tem dieta balanceada, costumes não violentos, dorme ao menos oito horas/dia... Não tema os anos 70 para cima. Sinceramente, nada muda se for saudável. Carlos Marti foi muito feliz em seu comentário, e Cíntia uma pessimista equilibrada e o Baile-do-mela-cueca bastante hilário!
Afinal, para dizer que nada tenho a dizer, tenho sim: não pense jamais na velhice como o fim de tudo. A Vida não envelhece, nós é que envelhecemos a Vida, com pensamentos obtusos. Otimismo é a chave para a felicidade. Também não admito entrar em grupinhos de festinhas e arrasta pés da "melhor idade". Aceitar o envelhecer é outra maneira de se sair bem. Apesar de todas as minhas limitações, vivo e estou feliz pelos meus 74 anos, ainda que me sinta arrasado pela perda de uma filha amada. Este fato foi um "acidente de percurso" e meu coração está na UTI, ainda. Não tinha nada a dizer e disse tanto.

Marco Antonio Zanfra disse...

Sou suspeito para falar da Folha, Carles, porque foi meu primeiro emprego e tenho razões sentimentais para tê-la como o melhor jornal do País. Mas Clóvis Rossi anda mesmo dando umas derrapadas, assim como Josias de Souza. Fábio Seixas eu não leio; quanto ao Kennedy, o pouco que li dele deu a impressão de um neoliberal ainda com medo de assumir as posições. Quero dizer que continuo fã do Rossi, mas agora com mais restrições do que tinha há dois ou três anos.

Marco Antonio Zanfra disse...

Morani, se eu passar dos 60 sem muitos arranhões e hematomas, quero chegar pelo menos aos 74 com sua lucidez. "Melhor idade" é a sua, meu caro.

cilmar machado disse...

Sábio e muito belo o ¨conselho¨ do Morani. Também serei septuagenário em 2016, mas encaro meus atuais 68 anos com muita saúde e galhardia. Agora agradeço a vida regrada a que me submeti e também a aconselho para os amigos, como receita de longa vida. Gosado, Zanfra! Quando nos transformamos em sexagenários, vem aquela alegria tola do jovem de minha época em que, ao completar os 18 anos, já podia assistir aos filmes ¨proibidos¨. Agora eu posso: entrar na fila especial dos Bancos, ter passe live nos Coletivos e ter o tratamento diferenciado a que você se aludiu. Mas, depois de algum tempo, como outrora, a gente enjoa, viu? Aí é preciso mesmo uma Olimpíada para dar nova cor à nossa vida... rs rs rs

Vico disse...

Ora, rapaz, quando você tinha 18 anos imaginava que iria chegar aos 50 com essa vitalidade toda? Com certeza, você achava que iria estar velho e acabado. Por isso, não esquenta: os 60 vão chegar com a mesma naturalidade dos 50. Palavra de quem acha que vai chegar aos 40 velho e alquebrado...

Marco Antonio Zanfra disse...

Lamento desapontá-lo, Cilmar, mas não acho que eu vá encarar o atendimento preferencial e o passe livre com a mesma felicidade com que encarei a permissão para ver filmes "proibidos para menores". Talvez, como disse o Vico, eu absorva a nova idade como tenho absorvido as novas idadades anteriores, mas, por enquanto, continuo vendo a chegada aos 60 como fim do processo de envelhecimento.

Cintia disse...

Quando fiz 18 anos e ganhei acesso aos filmes proibidos, perdi a aventura da transgressao, de quando cabulava a aula - pulava o muro do colegio, e ia com um bando de amigas ao Cinema do Shopping Center Lapa, burlava a seguranca - qua na verdade nao existia - e assistia aos filmes horrorosos da epoca ! Nao conta pra minha mae! Ela ainda pensa que eu era santa!

Marco Antonio Zanfra disse...

Dentro desse seu espírito de transgressão, vou começar a não pagar ônibus e a entrar na fila do idoso...

Cintia disse...

O pior é se alguem se levantar e te oferecer o assento ..

Cintia disse...

E a proposito da zebra, esse dilema ja foi solucionado: as zebras sao brancas com listras pretas..

Fabiano Marques disse...

No caso dos burricos, literalmente, FAIXA DE GAZA!

Gleydson disse...

Só não começa a ir pra bingo, por favor! Rererererere...

Abraços!

Marco Antonio Zanfra disse...

Até lá, acho que até os cassinos vão estar liberados!

Eliz disse...

Oi Zanfra,

Infelizmente seis anos passam muito rápido... Quem sabe até lá já tenho um filhinho para assistir as olímpiadas comigo e meu namorido... Ehehe!

Bjão.

Unknown disse...

Marco, o que eu quis dizer é que acho os textos do Rossi, se comparados com o dos pseudo-jornalista aos que me referi, estão há anos luz. Minha dúvido era se se tratava de uma sensação minha ou não. É que não tenho lido que se pareçan, nem de perto à coerência e sensatez do que eu tenho lido nas colunas dele. Apesar disso, acredito que você tenha razão quanto às derrapadas, mas é provável que seja complicado para qualquer um fazer parte do conselho editorial e suportar a pressão dos proprietários, que se utilizam o jornal praa atacar de forma sistemática a esquerda que supostamente, num poassado não tão longínquo, já esteve próxima à linha ideológica da Folha.

Unknown disse...

Cintia, a Espanha, mais bem a faixa do Mediterrâneo, é a Florida da Europa, destino final de sexa, septa e octogenários não só espanhóis, mas principalmente ingleses, alemães e russos, que costumam comprar uma casa na praia nas cidades da zona quando se aposentam, chegando em alguns casos, a predominar sobre a população espanhola (caso de Marbella, Ibiza, Calpe, El Campello e outros). Inclusive yankes. Além do tempo mais afável da zona, atrai-os o benévolo sistema de saúde público espanhol. Portanto, sejam bem-vindos. Por certo, José Luis esteve hoje com barak, não?

Unknown disse...

E quanto ao leitor de A Familia Mata que deixou um recadinho sobre as férias do autor, devo dizer que o motivo da ausência foi justamente o contrário. Trabalho e não férias. Como pode comprovar, tivemos um feriadão aqui também, mais extenso ao de vcs (o nosso começou na quinta) e aproveitei para atualizar (começar a) minha colaborações.

Marco Antonio Zanfra disse...

Até que enfim: a família Mata estava quase virando a família Suicida...

Unknown disse...

Oi Zanfra,
como teu contemporâneo, acho que sessenta é só o começo de uma nova fase (mais relaxada e descompromissada)da vida.
Pensa num trabalho mais light, nas viagens, nos netos.
Acredito que a paciência, a tranquilidade terão mais espaço nesta próxima fase.
Um forte abraço,
Jacinto.

Marco Antonio Zanfra disse...

Não creio, Jacinto. Será que sete anos serão suficientes para dissipar tanta agressividade, intolerância, impaciência, ansiedade e rabugice que ocupam o meu coraçãozinho?

Kafka disse...

Não há nada que o tempo não acomode, caro Zanfra.Depois dos 60, você vai estar tão ocupado com as próprias artrites e disfunções eréteis que não terá tempo de despejar sua agressividade, intolerância, impaciência e rabugice em cima dos outros.

Serafim disse...

Caro Zanfra

Dizem as lendas que a vida começa aos 40. Sendo assim,como estou na faixa dos 57,falta somente 1 aninho prá tirar o título de eleitor.Estou ansioso
Quanto a Cintia, indo até a Espanha, recomendo uma esticada até Portugal pois existem ótimas praias por lá.

Abraços

Carlos Martí disse...

Muito boas, as praias portuguesas. A diferença, e por isso os mais velhos dizem preferir as águas do Mediterrâneo, é a temperatura da água. É bom lembrar que o Atlântico, que banha o litoral luso e a Galícia recebe águas glaciais e os turistas mais velhos costuma se quexar que é muito frio.

José Luiz Teixeira disse...

Sessenta anos, caro Zanfra, é a idade do metal: prata nos cabelos, ouro nos dentes e chumbo no...

Marco Antonio Zanfra disse...

Discordo de duas coisas, Zé: "ouro nos dentes" parece uma coisa já em desuso muitos anos e muitas crises atrás; e, com tanto álcool, fumo, agrotóxicos, conservantes químicos etc., a incidência do "chumbo no..." pode acontecer bem antes dos sessenta!

Cintia disse...

Serafim, tenho que concordar com o Carlos.
Meus pezinhos ja experimentaram as aguas geladas do mar de Portugal (fiquei so no pezinho mesmo)! Nem no Rio de Janeiro eu consigo entrar no mar de tao frio! Vou preferir algum lugar mais quentinho, mas isso esta tao no futuro que ate la muitas outras ideias vao passar por minha cabeca!

Gennara disse...

Pelo jeito, alguém aqui está com medo de envelhecer... Ora, meu amigo, a vida é isso que você tem para viver. Nada vai mudar, com ou sem o seu consentimento. Então, como diria Marta Suplicy, "relaxa e goza"...