segunda-feira, 9 de agosto de 2010

A lei é para todos!

De vez em quando a gente tem de reconhecer e aplaudir: a Justiça está aí para tirar das ruas criminosos sanguinários e deletérios, para manter-se atenta e não medir esforços para preencher as milhares de vagas ociosas de nosso exemplar sistema penitenciário.
A última medida de impacto desses paladinos da lei, digna de loas e de constar nos anais da história jurídica brasileira, vem de uma juíza da zona leste de São Paulo, que colocou no rol de foragidos da Justiça uma perigosa diarista, desempregada e mãe de dez filhos, que não pagou – sob a indesculpável e inverossímil alegação de que não tem dinheiro, veja só! – a quantia de R$ 300 que lhe fora estabelecida como fiança, para responder em liberdade pelo crime de tentativa de furto.
Pois vejam, meu poucos mas selecionados leitores: a mulher errou, tentou furtar bermudas e pares de sapato num supermercado para vestir e calçar os filhos, foi presa em flagrante, conseguiu o benefício da liberdade provisória... e agora não quer pagar o que deve? Quem ela pensa que é? Algum político, banqueiro ou desembargador que vende sentenças? Ela pensou que a Justiça não a alcançaria só porque é pobre e mora longe?
E olhem que ela sequer poderia alegar falta de dinheiro, pois recebe R$ 330 mensais de uma bolsa assistencial do governo, o que seria suficiente para honrar sua dívida e para comprar, procurando bem no comércio popular, pelo menos três bermudas para os filhos. Ou seja: precisava roubar, gente?
A perigosa diarista, provavelmente membro graduado do crime organizado na zona leste, tem 38 anos, e mora com o marido, os dez filhos, um genro e uma neta numa casa de quatro cômodos no sopé de um morro em Cidade Tiradentes. Todos os habitantes da casa em idade produtiva estão desempregados, mas isso não é desculpa para justificar a miséria e a tentativa de furto.
A juíza que expediu mandado de prisão contra a foragida disse que não se lembra do caso. Nem poderia: se ela fosse lembrar-se de cada malfeitor que manda para trás das grades, para a tranquilidade da população honesta e trabalhadora, não teria neurônios suficientes em seu cérebro privilegiado para cuidar de outra coisa.
Mas, para ameaçar o sossego da parcela ordeira e produtiva de habitantes da zona leste paulistana, a juíza acenou com a possibilidade de rever sua decisão, só porque uma defensora pública considerou-a equivocada, já que a meliante é primária, e porque a Folha de S. Paulo – jornal claramente calcado na luta pela reversão dos valores cristãos – resolveu noticiar o fato como se absurda fosse a decisão da magistrada.
Ora, ora, onde vamos parar? Meu medo, queridos leitores, é que acabemos diante de mais um caso de vergonhosa impunidade!

11 comentários:

Blog do Morani disse...

Zanfra:

Vai com atraso, mas vai: que o seu Dia dos Pais tenha sido dos mais agradáveis.
Com relação ao seu comentário atual, após ler e relê-lo fiquei em dúvida sobre a autenticidade de sua veemente defesa a favor da prisão da diarista que tentou roubar bermudas e tênis em super mercado. Como a Justiça brasileira deixa de lado os ladrões de colarinho branco, fico matutando cá comigo: todo crime é crime, por menor que seja. O dessa senhora admito como crime, mas há as atenuantes e outros "crimes", mais cabeludos que esse que assume caráter de banalidade diante àqueles. Não estará o amigo usando uma colocação jocosa, no caso da diarista? Abraços.

Marco Antonio Zanfra disse...

Certamente, Morani, que estou ironizando a veemência com que o pequeno delito da coitada foi enquadrado, quando há tantos e tantos "bandidos" por aí escudados em foros privilegiados e imunes a mandados de prisão. Pensei que tivesse sido claro quando disse que a "perigosa diarista" não escaparia às garras da lei porque não era política, banqueira ou desembargadora que vendia sentenças e seria "punida", no máximo, com a aposentadoria e com vencimentos de R$ 25 mil por mês.

Blog do Morani disse...

Zanfra:

Você foi bastante claro, mas a sua firmeza à abordagem da matéria a um desavisado poderia mostrar o contrário de suas intenções.
A gente balança assim, mesmo sabendo com quem estamos tratando, por ser realmente um crime banal, mas crime punível como outro qualquer. Entretanto... há os senões e as atenuantes. Abraços.

Vico disse...

Sutil como uma empilhadeira desgovernada. Cuidado que a citada magistrada pode expedir mandado de captura para nosso blogueiro predileto.

Marco Antonio Zanfra disse...

A Justiça paulista acabou revogando, ontem, o mandado de prisão contra a perigosa facínora, caro Vico. Por isso, não creio que a citada juíza tenha cacife para mandar prender pessoas menos perigosas que a diarista, como este blogueiro.

Anônimo disse...

Todo crime é crime, redundante, e deve ser punido.
Agora essa senhora também não poderia ter cometido esse tipo de delito que a sociedade não vai ver como os casos que tivemos num passado rescente. Desempregado é preso por atentar contra o meio ambiente - o crime, arrancou uma casca de uma arvore para fazer um chá???? e outro caso que correu pela midia geral - Diarista rouba um pote de margarina e toma 5 anos de cadeia - Quanta eficiência dos nossos magistrados!
Sem considerar os privilegiados que pululam nos nossos tribunais tais como Politicos, Abonados Financeiramente, empresarios, chefes de tráfico,etc, não podemos realmente passar as mãos na cabeça de todos os pobres que tentar resolver seus problemas praticando qualquer tipo de furto por menor que seja.
Tenho dito!

cilmar machado disse...

Ante tanta injustiça e incompetência só mesmo o sarcasmo. Na crônica desta semana, você foi mestre nisso, Zanfra. Acredito seja esse o único comportamento possível para quem tenha um mínimo de sensibilidade e senso de justiça. Que país é esse?...

Ricardo Câmara disse...

Prezado Zanfra;
Apoveitando a sua sátira, envolvendo essa "ladra de alta periculosidade", tendo em vista a prática de um "crime hediondo", a decisão da MMª juíza de plantão foi sensacional em expedir no rol dos foragidos da justiça essa diarista que tentou praticar o furto não concluído sequer pagou pela fiança em liberdade de R$ 300,00.Ora, isso é muito grave para a sociedade num todo e para alta cúpula dos doutos que através de várias laudas escritas,na lide, quanto papel!toma uma decisão peremptória tomando como base o que lei diz e sob a égide da jusrisprudência,aplica uma setença notória sobre a "perigosa ré".São pessoas assim, como essa juíza, que a sociedade aplaude e louva por tal atitude, concordam?! Pois bem,em contrapartida, o que dizer então, daquelas calúnias em detrimento dos "honestos" e "injustiçados" 23 desembargadores do TJMT que foram aposentados compulsoriamente baseados em mentiras (desvio de verbas, peculato) que fogem do "notável saber jurídico e reputação ilibada" - art.101 CF- Ora isso é um ultraje, não acham ? Gurdai-nos da 'societas sceleris'(sociedade dos crime)!

Serafim disse...

CARO ZANFRA

Tá certo que crime é crime e deve existir penalidades, mas será que a Doutora teria a mesma eficiência com alguém de "colarinho branco"?Afinal,a justiça não é cega?
Não nos esquecemos que em Outubro teremos vários para "escolher".

Abraços

Anônimo disse...

Prezado Zanfra
Apesar de entender sua abordagem,me veio à lembrança uma cena de minha infância.Meu pai precisava operar uma úlcera quase suporada,minha mãe trabalhava como diarista e eu tinha lá meus 5 anos de idade.Um dia surpreendi minha mãe abrindo meu cofrinho e tirando de lá a maior nota a qual tinha ganho de meu padrinho de batismo (o único abonado e que não era nenhum parente,a não ser meu padrinho).Reclamei da atitude de minha mãe,levei a maior surra e ela me disse:se eu não fizer isto,não teremos comida à mesa.Com o tempo,entendi que ela estava só "emprestando"...mas nunca teve condições de me devolver.Mas isso,era antigamente...
bjussssssssssss sonia carotta

Marco Antonio Zanfra disse...

Testemunhou uma, digamos, apropriação indébita e ainda tomou uma surra?! Na linguagem da reportagem policial, isto se chama "queima de arquivo"...